quinta-feira, 28 de junho de 2012

- Meu Deus, que dia! Tudo o que eu mais quero é me atirar nos braços dele...

Este foi o primeiro pensamento que lhe ocorreu depois que se despediu dos colegas e apertou o botão térreo do elevador.

Aquela frase silenciosamente articulada, expunha todo o ímpeto com que tomara a sua decisão. Naquela noite não haveria mais volta, iria entregar-se novamente.

Foi uma decisão difícil para ela. Há quanto tempo vinha resistindo? Nem se lembrava mais. Durante este longo período em que se manteve distante, todos os seus atos vinham sendo rigorosamente calculados. Agia desta maneira porque sempre teve em mente propósitos muito maiores e que por si só justificavam tal distanciamento. De qualquer modo, ela estava consciente de que as coisas não seriam mais as mesmas depois que se desse por vencida. Mesmo assim não deixou de se sentir orgulhosa por até então, não ter infringido as regras de um pacto que há muito tinha feito consigo mesma. Tinha sido fiel e obstinada, isso ninguém poderia negar. Até aquele dia, até aquela noite... que aos poucos se aproximava.

Ela sabia que ele estaria lá à sua espera, pronto para saciar todos os seus desejos de mulher. Sempre fora assim, ele sempre esteve à disposição. Desde que se conheceram, ele a decifrava pelo olhar. Por um instante sentiu-se aliviada. O jeito de ser dele lhe pouparia de ter que dar maiores explicações. Pelo menos não naquela noite. Tudo o que ela queria era sentir prazer sem ter que dar satisfações a ninguém.

Ele era diferente de todos os outros. Era fiel, dava ótimos conselhos, era dócil, compreensivo, predispunha-se a ouvi-la, jamais discutia e aninhava uma mulher no seu colo como nenhum outro.

O colo dele, a propósito, era um capítulo à parte. Silenciosamente, ele oferecia aconchego e serenidade. Ali, sem sombra de dúvidas, era o refúgio mais secreto daquela mulher, o único lugar no mundo em que se sentia completamente à vontade para ser quem ela era e poder levitar em seus sonhos sem medo de ser acordada.

Nunca foi preciso sincronizar as agendas com ele. Sempre que ela precisou, ele estava lá, pronto para afagá-la. Não interessava hora, compromisso profissional, jogo de futebol ou aniversário de tia-avó; ele não pensava duas vezes, largava tudo e ia ao encontro dela.

Em contrapartida, inexplicavelmente, ela não se sentia na obrigação de agradá-lo. Era sim muito apaixonada por ele mas nunca lhe prometeu nada, nem mesmo fidelidade.

Além disso, não era preciso que ela ocupasse parte de seu tempo elaborando estratégias de sedução no intuito de trazer coisas novas para apimentar a relação. Por isso, ela não ficava preocupada com o esmalte que deveria usar, com a depilação que deveria fazer, com os quilos a mais ou a menos, com a calcinha que iria escolher, com os acessórios que imaginou comprar para que se divertissem. Tudo supérfluo. Irremediavelmente, ele estaria lá. Era fato mais do que notório que ele apenas a servia e isso era o suficiente para satisfazer a ambos. Ela era a sua Ama e ele o seu mais subserviente criado.

Ela também era uma mulher diferente de todas as outras. Era amante de rituais. Quando se encontravam, fazia questão de despi-lo vagarosamente. Era um deleite para aquela mulher explorar cada milímetro do seu objeto de prazer. Com o decorrer dos anos, devorá-lo com os olhos virou fetiche – ela precisava, sentia necessidade de primeiro contemplá-lo inteiramente nu para só depois passar a tocá-lo. Assim, dessa forma singular, eles provocavam um ao outro quando estavam a sós. Era um jogo. Não! Era uma dança... Um tango caprichosamente ritmado. Ele se exibia sem pudor, mostrando-se por inteiro e enaltecendo sua capacidade de proporcionar prazer imediato e sem limites. No fundo, sabia-se detentor de um dos gatilhos que despertavam os mais profundos desejos daquela mulher. E ela... Ahhh, ela era uma perfeita voyeur, deixava-se hipnotizar e ser conduzida por aquele momento.

Até recobrar a consciên... (cia)...

Tarde demais para ela. O transe já começara e a essa altura, o perfume dele já tomava conta do ambiente e penetrara suas narinas. Ele exalava todo o seu aroma inconfundível pelos poros. Era inebriante. Aquele cheiro a entorpecia por completo. Dos cinco sentidos de que dispomos, o da visão, até então o único explorado, já não era mais suficiente. Tornou-se raso, ínfimo. Ela queria muito mais. Queria ser preenchida de uma só vez por todos eles. Ela precisava tocá-lo. Precisava senti-lo derreter em seus lábios. Precisava ouvir os anjos tocarem suas liras ao presenciarem o seu deleite. Precisava sussurrar baixinho de tanto prazer.

- Maldito molho de chaves que se perde dentro da minha bolsa! – resmungou ela enquanto abria apressadamente a porta de casa.

Tão logo fechou a porta correu em direção a ele. Ansiosa por aquele momento, arrastou-o consigo para o sofá, onde sôfrega suspirou de saudade. O show estava prestes a começar.

Chovia e fazia muito frio lá fora. Ali dentro as paredes ferviam. Ela olhou para ele e sorriu. Seu destino estava selado. Era como tinha que ser. Ele era o seu amigo, seu companheiro e seu amante. Só ele a compreendia, só ele a completava. E era justamente por isso que seria eternamente grata àquela deliciosa barra de chocolate ao leite - mesmo que tivesse que quebrar o seu regime e arcar com duzentos gramas a mais.

2 comentários:

Marcio JR disse...

Pois é, né? Ontem, na correria de meu dia, fiquei p. da cara com você. Eu fui descendo o texto, correndo pra chegar ao final e..................... chocolateeeeeeee?

PelamordeDeus. Por que não um empadão, ou uma torta de ricota? rsrs.

Neca, mocinha. Por mais inusitado que o final possa ter sido, quero enaltecer também a condução do texto. Um show a parte. Tá afiada na arte, e a cada postagem, você me surpreende mais. Bom, penso ser desnecessário dizer que adorei, mesmo tendo ficado braaaaaaaabo.

Nequinha, bom findi, pro'cê. Bjs.

Marcio

29 de junho de 2012 às 21:49
Neca disse...

Mas, Marcinho....
"Quem" mais poderia completar, tão plenamente, uma mulher assim?!

Beijocas!!!!!

2 de julho de 2012 às 10:41

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