Há um tipo de verdade que de tempos em tempos chega sem avisar e costuma bagunçar o meu dia.

Esta verdade, minha velha conhecida, nunca traz nada de novo. Pelo contrário! Inconveniente como só ela consegue ser, me faz lembrar das coisas que eu quero esquecer, me provoca  palpitações, me causa vontades imprecisas e, sobretudo, me faz sentir saudade... muita saudade. 

E é aí que a coisa degringola de vez...

Meus pensamentos assumem o controle e eu penso em tudo e em nada ao mesmo tempo - o que, para causar ainda mais confusão, acaba se tornando exatamente a mesma coisa. 

Assim, tudo o que já não faz mais qualquer sentido acaba novamente se enfileirando diante do imaginário de quem nunca compreendeu nada e por isso acabou sofrendo por tudo. Eu.

E a coisa toda vai evoluindo de maneira tal que quando eu vejo,..., já era. 

Num piscar de olhos alcançou proporções inimagináveis. 

Num primeiro momento, os pequenos detalhes do cotidiano tornam-se insustentáveis, as tensões do dia-a-dia transformam-se em sacrifícios, o encontro de amanhã é supérfluo e a decisão de agora é a única coisa realmente urgente.

Logo depois, passo a concluir que o ontem deixou de existir e tudo aquilo que foi construído para que eu conseguisse chegar até aqui virou poeira.

Aí o tempo passa ...

Dez, vinte, trinta minutos...

Uma, duas, três horas...

... e como num passe de mágica todas as coisas voltam a ser exatamente o que parecem ser e não há harmonia que se sustente intacta.

É quando busco consolo. 

Talvez em presenças próximas? Bem provável. Muito embora a impressão que eu tenha é a de que estejam todos muito aquém das minhas necessidades prementes desse agora que pra mim é absoluto e incompreensível, indivisível e incomunicável.

...

Costumo imaginar que esta verdade adquiriu um estranho hábito de se afugentar em algum lugar inacessível - como quem aguarda em silêncio, à espera de uma nova oportunidade para se manifestar novamente.  

Enquanto ela fica quietinha, vivo meus dias fazendo de conta que ela não existe. 

Tudo passa. Menos esta verdade antiga que sempre volta.

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Não sou uma católica fervorosa, tampouco uma descrente absoluta.

Também não me encaixaria num coral de carolas e sequer vou à missa com frequência. 

Além disso, não acredito em inferno, diabo, reencarnação, poções milagrosas, macumbas e simpatias.

E apesar de um tanto quanto avessa a imagens de santos, ontem, tentando organizar o caos que é a minha bolsa, para minha total surpresa 're-encontrei' um santinho ali.

Isso mesmo..., um santinho! Daqueles que as pessoas mandam imprimir uma tiragem de 5.000 cópias em agradecimento (e para não ficar na pendura com o santo) e depois distribuem por aí.

Pois é, o Padre Pio estava ali, dobrado, escondidinho e esquecido no bolso lateral da minha bolsa. Lembro-me bem de quando e como ele foi parar ali.

Da mesma forma, não me esqueço das muitas vezes em que peguei aquele pedacinho de papel nas mãos e depositei, naquelas orações ali impressas, toda a minha fé. 

Durante muito tempo conversei, me confessei, confidenciei, procurei abrigo e fiz pedidos a Padre Pio. Nunca pedi por milagres, apenas o humanamente possível. Em inúmeras situações fui atendida.  

Agora, tempos depois, nos reencontramos; ele, todo amassadinho e gasto e, eu, acometida por uma sensação gigantesca de ingratidão.  

- Não, Padre Pio, eu não deixei de acreditar no Senhor e sempre lhe serei grata pelas vezes em que acalmaste o meu coração e atendeste às minhas súplicas. Apenas me resignei diante de tantas circunstâncias(!). 

Não dá para apelar sempre para o divino, isto já estou careca de saber.

É preciso que as coisas aconteçam como têm que acontecer, que as pessoas tomem as decisões que tenham que tomar, que as escolhas sejam feitas espontaneamente de acordo com as convicções de cada um e que o destino trace o caminho certo a ser percorrido. 

Dito isto, dei um beijinho na imagem e tornei a guardá-la na minha bolsa. Quero que fique ali comigo, sem pedidos, apenas como companhia.

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Deixar que o tempo faça a sua parte funciona tal como sonrisal. Você compacta seus dissabores numa pastilha e coloca num copo com água. Aos poucos vai percebendo que os sentimentos ruins efervescem ao passo que os que realmente importam e têm propriedades terapêuticas permanecem no fundo do copo semimisturados à água. Basta que você dê uma mexidinha antes de tomar e pronto! É alívio quase imediato para quase todas as dores.

(...)

De uma forma ou de outra a gente vai acomodando a vida. Dribla um desencanto aqui, reinventa outra alternativa ali e, aos poucos, vai arranjando lugar para algumas coisas que precisam ficar encaixotadas na dispensa dos pensamentos. Com o decorrer do tempo tudo vai se ajeitando.

Entretanto, existe uma única categoria que não admite clausura e não convalesce com o passar das horas, dias e meses. Nada! Não há embrulho que comporte, não há compartimento que acomode, não há espaço físico que suporte, não há silêncio que aplaque, não há distância que separe, não há remédio que combata uma saudade.

A saudade, inclusive, é totalmente imune à ação do tempo e não tem cura. Sintomaticamente progressiva, ela só aumenta à medida em que os dias passam e pode se alastrar pelo corpo todo. Sim, o organismo inteiro da gente sente saudade e todas as nossas funções vitais podem ser contaminadas por ela.

Nossa... escrevendo assim pode até parecer que estou dando a entender que seja algo que se assemelhe a algum câncer ou doença degenerativa. Aliás, eu mesma já cheguei a pensar que a saudade era algo ruim, que machucava e corroía por ser intermitente.

Que bobagem! Longe disso...

Hoje, com o tempo, descobri que a saudade é o pozinho de sonrisal que ficou no fundo do copo. Pode até ser que não nos cure de todos os males, mas lembrar de fatos ou pessoas que nos fizeram felizes pode nos aliviar do mal-estar. Afinal, só sentimos saudade daquilo que um dia foi valioso pra gente. Ninguém sente saudade das coisas ruins.

É por isso que nesta terça-feira (e em todas que virão) a saudade anda comigo e está nos meus olhos para quem quiser ver. A minha saudade se renova todos os dias e jamais será apagada. É muito bom sentir saudade. Na minha bula não constam contra-indicações e está escrito em letras garrafais que ela é feita das melhores lembranças da minha vida e que hoje enfeitam quem eu sou.

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